Modalidade tida como a mais recente entre os tipos de turismo de natureza, o geoturismo vem ganhando espaço na pauta de pesquisas de algumas universidades do país. E com um olhar bastante inclusivo. Agrega também aspectos educacionais e culturais. É o caso do trabalho “Proposta de roteiros geoturísticos para o município de Ipeúna-SP: Subsídios para o planejamento turístico”, de Marina Ciccolin de Almeida.
O estudo foi apresentado como trabalho de conclusão de curso ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), campus de Rio Claro, SP, para a obtenção do grau geólogo. E faz um levantamento minucioso do potencial geoturístico do município com vista ao desenvolvimento sustentável, à preservação do patrimônio histórico e cultural e ao fomento à educação.
Com orientação do professor doutor José Eduardo Zaine e coorientação do mestre André de Andrade Kolya, ambos da Unesp Rio Claro, o trabalho foi apresentado à banca examinadora em dezembro de 2019, no anfiteatro da Biblioteca Unesp. Compuseram a banca, além do professor Zaine, o professor doutor Washington Barbosa Leite Júnior e o doutor Flávio Henrique Rodrigues.
Ao longo de um ano de trabalho de campo e bibliográfico, com auxílio de sensoriamento remoto e cartografia, Marina Ciccolin elencou os pontos mais pertinentes ao turismo natural e histórico/cultural no município. Com os dados coletados e processados, chegou às 15 localidades mais representativas ao geoturismo local, reunidas num mapa elaborado pela autora. Parte delas, aquelas com turismo natural e entrada franqueada ao público geral, transformou-se em uma proposta de roteiro tripartida.
O primeiro roteiro, chamado Caminho das Rochas, é voltado sobretudo à comunidade científica e a estudantes universitários e de ensino médio. Olhar para os quatro afloramentos ali presentes é vislumbrar um passado muito distante, de eras como a Paleozoica e a Cenozoica ou do período Triássico. Sítios arqueológicos e jazidas fossilíferas fazem parte do roteiro, onde é possível encontrar fragmentos de ossos de mesossauros de cerca de 250 milhões de anos.
O segundo, denominado Caminho das Águas, contempla rios e cachoeiras. Tem forte apelo com a comunidade local e turistas que visitam a cidade em busca de recreação em suas águas. Nesse roteiro também se encontra um importante sítio arqueológico, com vários achados de origem lítica, como pontas de lança, raspadores e machados (datados de cerca de 11 mil anos).
Por fim, o Caminho da Natureza propõe uma abordagem geoecológica. Busca associar os aspectos da geodiversidade com os da biodiversidade. Chamam atenção aqui características marcantes do relevo, como as cuestas e os morros testemunho, e suas relações com as interações ecológicas. É a meca dos esportes off-road. Mas não só. Caminhada, observação de flora e fauna, pesquisa acadêmica… Versatilidade é a marca do Caminho da Natureza.
A profusão de roteiros justifica-se. Município do centro-leste do estado de São Paulo, Ipeúna se assenta em uma área de interface entre cuestas basálticas e a depressão paulista. Vem daí grande parte das belezas naturais e geológicas do entorno, com atributos espeleológicos, estratigráficos, geomorfológicos, paleontológicos, arqueológicos e ambientais.
É toda essa riqueza peculiar que faz de Ipeúna um dos oito municípios da Bacia Hidrográfica do Rio Corumbataí que dão forma ao Projeto Geoparque Corumbataí. A iniciativa de preservação do patrimônio natural, histórico e cultural com difusão do geoturismo conta ainda com o apoio da Unesp Rio Claro, da Unicamp e do Consórcio PCJ.
Em uma cidade com economia dependente da indústria, roteiros geoturísticos como esses podem ser o ponto de virada para o desenvolvimento de uma economia de caráter sustentável. E mais. Ao valorizarem e colocarem o patrimônio geológico na mira dos turistas, podem incrementar o comércio da cidade, contribuindo para a geração de renda e seu desenvolvimento.
Além disso, o trabalho tem outro mérito. Historicamente, costumamos negligenciar os aspectos abióticos em favor dos bióticos. Sobretudo quando o assunto é proteção ambiental. Como se pudessem ser desconectados ou se o segundo contivesse maior valor intrínseco. Ao dispor os elementos geológicos no centro da atratividade, da diversidade natural e da conservação, junto da fauna e flora, a autora nos ajuda a entender a amplitude e as potencialidades dos elementos geológicos e a importância da geoconservação.